Mais de mil figuras políticas europeias criticaram numa carta aberta o plano de Israel para a anexação da Cisjordânia, alegando que tal ação seria "fatal para as perspetivas de paz entre Israel e Palestina". O manifesto representa 25 países europeus, incluindo Portugal, que pretendem uma solução de dois Estados para essa região do Médio Oriente.
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Palestina. Um milhar de políticos europeus condenam anexação da Cisjordânia
Por Joana Raposo Santos
“O novo acordo de coligação de Israel afirma que o Governo pode avançar com a anexação a partir de 1 de julho. Essa ação será fatal para as perspetivas de paz entre Israel e Palestina e desafiará as normas mais básicas que guiam as relações internacionais”.
Os 1080 signatários dizem-se, por isso, “profundamente preocupados quanto ao impacto da anexação na vida dos israelitas e palestinianos, assim como quanto ao seu potencial de desestabilização numa região que fica à porta do continente europeu”.
Pedem, por isso, aos líderes europeus que atuem de forma decisiva. “A Europa deve dar o primeiro passo e juntar atores internacionais que previnam a anexação de modo a salvaguardar as perspetivas de uma solução de dois Estados e de uma resolução justa do conflito”, apelam.
Para que a segurança e os direitos de israelitas e palestinianos sejam garantidos de forma igualitária, a Europa deve empenhar-se em promover mais esforços que alcancem uma solução justa, acrescentam.
Os responsáveis europeus referem-se ainda ao “plano” elaborado pela Administração Trump para o Médio Oriente, apresentado no início deste ano, e que defende Jerusalém como “a capital indivisível de Israel”.
A intenção do Presidente norte-americano é que a capital da Palestina seja Abu Dis, uma vila de Jerusalém, e garantiu na altura que, caso esse cenário se concretize, os Estados Unidos lá instalarão uma Embaixada.
“Lamentavelmente, o plano do Presidente Trump afasta-se dos parâmetros e princípios acordados internacionalmente. Promove o controlo israelita permanente sobre um território palestiniano fragmentado, deixando os palestinianos sem soberania e dando uma luz verde a Israel para unilateralmente anexar partes da Cisjordânia”, criticam as figuras europeias que subscreveram a recente carta aberta.
A carta foi assinada por responsáveis políticos de 25 países. Do lado de Portugal, foram 17 os signatários: André Pinotes Batista, Pedro Bacelar de Vasconcelos, Luís Graça, Catarina Marcelino, Isabel Moreira, Paulo Pisco, Alexandre Quintanilha, Tiago Barbosa Ribeiro e Carla Sousa (Partido Socialista); Joana Mortágua, José Manuel Pureza, Pedro Filipe Soares e João Vasconcelos (Bloco de Esquerda); Pedro Rodrigues (Partido Social-Democrata); Isabel Carvalhais e Isabel Santos (Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas - Parlamento Europeu) e, por fim, Francisco Guerreiro (Verdes/Aliança Livre Europeia – Parlamento Europeu).
O envio da carta aconteceu pouco antes de, esta quarta-feira, se ter dado início a uma reunião do Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre a anexação – o último encontro internacional antes da data anunciada pelo primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu.
O executivo de Netanyahu deixou claro que pretende, a 1 de julho, anexar colonatos construídos ilegalmente na Cisjordânia, cumprindo com o plano traçado por Donald Trump em janeiro.
Bélgica vota sobre o reconhecimento do Estado palestiniano
A Bélgica, que também está representada na carta assinada por políticos europeus e que tem sido um dos países europeus mais hostis em relação a Israel, vai votar na Câmara dos Representantes na quinta-feira o reconhecimento do Estado palestiniano. Vai ainda ser votada uma outra resolução que apela a sanções por parte da União Europeia contra Israel caso esse país avance com a anexação.
A primeira resolução pretende que a Bélgica “reconheça formalmente o Estado da Palestina e considere esse reconhecimento uma contribuição da Bélgica para a solução baseada na coexistência de dois Estados”.
Já a segunda pede que a União Europeia tome medidas efetivas e que aposte em coligações entre Estados-membros “de modo a fornecer uma resposta apropriada a qualquer anexação israelita dos territórios palestinianos”.
“A violação contínua da lei internacional, assim como o não cumprimento de muitas das resoluções da ONU pelo Estado israelita não podem ser ignorados”, defende a resolução belga. “E, em caso de anexação, serão ainda mais necessárias e oportunas medidas nesse sentido”.
O reconhecimento do Estado palestiniano por parte da Bélgica não deverá, porém, ser aprovado na votação de amanhã. A resolução passou com apenas um voto no Comité dos Negócios Estrangeiros no início do mês.
“A decisão de ‘reconhecer a Palestina’ seria totalmente contraproducente, pois encorajaria os palestinianos na sua presistente recusa em negociar e colocaria em causa a credibilidade da Bélgica”, considerou, através do Twitter, o embaixador israelita na Bélgica, Emmanuel Nahshon.
“Será como o apartheid”
Benjamin Pogrund, prestigiado autor israelita que, depois de passar décadas na África do Sul a lutar contra o apartheid, nos últimos 20 anos tem defendido que o caso de Israel é diferente, está agora a reconsiderar as suas convicções.
Em entrevista à Al Jazeera, Pogrund admitiu que, se Israel seguir em frente com a anexação da Cisjordânia e do Vale do Jordão, não terá escolha se não considerar o seu país adoptivo como uma versão moderna da era do apartheid.
“Haverá domínios feudais numa área ocupada. E as pessoas que passarão a ser governadas [pelos israelitas] não terão os direitos mais básicos”, considerou o autor. “Isso será como o apartheid, e iremos merecer essa acusação. É algo que me preocupa gravemente, pois expõe-nos a enormes perigos”.
Já há vários anos que Israel tem sido rotulado como um Estado de apartheid, especialmente por dissidentes que utilizam essa expressão para descrever a relação do país com a Palestina.
Apesar de descrever a ocupação da Cisjordânia como “tirana e opressora”, até agora Benjamin Pogrund considerava que o conflito israelo-palestiniano não era vincado por um racismo “intencional e institucionalizado” como o que se verificava na África do Sul nessa época.
Na recente entrevista, porém, frisou que “a anexação vai levar a situação ao limite”. “Iremos autoinfligir essa situação a nós mesmos. Estamos a aplicar o apartheid – essa palavra odiada da segunda metade do século XX”.
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