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Palestino-brasileiros comemoram inserção da Questão Palestina nas universidades brasileiras

Instituído pela ONU em 1977 como o Dia Internacional de Solidariedade ao Povo Palestino

O 29 de novembro procura chamar a atenção para a luta desta população em fazer valer seus direitos de habitar seu próprio país, um direito comprometido desde a Partilha da Palestina pela Resolução 181 (que levou à autoproclamação do Estado de Israel), pela mesma Organização das Nações Unidades em 29 de novembro de 1947, e que causou à expulsão e morte de centenas de milhares de suas próprias terras (mais de 60% de toda a Palestina ou de até 88% quando considerado o território – 78% – apossado por Israel para se autoproclamar).

A data também serve como referência no mundo acadêmico brasileiro para estudos aprofundados da questão palestina. Universidades espalhadas de norte a sul do Brasil estão aumentando seu interesse em investigar, debater e difundir temas como a expulsão dos palestinos de suas terras no Oriente Médio e a continuidade da luta dos refugiados e seus descendentes ao redor do mundo, tudo para ver sua nação reconhecida.

O antropólogo e economista Hissa Mussa Hazin concluiu no ano passado um projeto de mestrado em Antropologia na UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), que investigou a primeira imigração de famílias palestinas para o Brasil, em 1890. O avô de Hissa era um dos imigrantes que aportou em terras brasileiras via Pernambuco. Na época, a Palestina era dominada pelo então Império Otomano, ou Turco, como era também conhecido, que não reconhecia os palestinos como um povo independente. Essa postura causava problemas de acesso a serviços básicos, como educação, saúde e direitos políticos aos palestinos que lá viviam. Esse acabou sendo o motivo da imigração para o Brasil.

“A ideia era fazer um pé de meia no Brasil e depois voltar para ajudar a família que havia ficado na Palestina, mas isso não aconteceu porque ao final da Primeira Guerra Mundial o domínio da região passou dos turcos, derrotados no conflito, para os ingleses, que começaram a incentivar a transferência de europeus de ascendência judaica para a palestina”, conta Hissa. A transferência atingiria seu ponto alto em 1948 com a saída da Inglaterra da Palestina e a entrega do território para a criação do Estado de Israel, forçando, pela violência, milhares de famílias palestinas a abandonarem suas terras ancestrais.

A imigração de famílias palestinas para a América do Sul também foi o ponto de partida do projeto de mestrado em Antropologia de Bárbara Caramuru Teles, na UFPR (Universidade Federal do Paraná). A antropóloga investigou no Chile como se formou a comunidade palestina naquele país, detentor da maior colônia palestina fora do Oriente Médio.

“O que quis compreender foram as formas de pertencimento identitário dos palestinos-chilenos”, afirma Bárbara, cujo título do mestrado está em espanhol para enfatizar como a comunidade está engajada na luta pela conquista de fato e de direito de suas terras. “La Tierra Palestina Es Más Cara Que El Oro”, o título da pesquisa, mergulhou na comunidade palestina da região de Santiago e procurou descobrir como vivem refugiados, palestinos e descendentes de palestinos e suas interações na própria comunidade.

Visibilidade

Para Bárbara, trabalhos de investigação no universo acadêmico sobre a questão palestino são urgentes. “É preciso dar visibilidade dentro da universidade para a causa palestina, que é um tema novo na área de ciências sociais. Com isso, podemos formar mais professores de História conscientes da realidade palestina”, observa a antropóloga. Ela considera que os trabalhos de investigação devem ser intensificados para denunciar o colonialismo enfrentado pelos palestinos em suas próprias terras.
“O projeto sionista de limpeza étnica da Palestina foi criado nos mesmos moldes clássicos, como foi aqui na América Latina e na África. O meu trabalho busca entender como foi mantida essa identidade dos palestinos no exílio, provocado pelos atos de ocupação sionista da região”, afirma Bárbara.

Conflitos

O exílio de milhares de palestinos e descendentes foi uma das facetas do conflito causado pela expulsão de parte do povo para continuar sobrevivendo. É o que procura entender Fabio Bacila, historiador paranaense descendente de palestinos e professor da UEPG (Universidade Estadual de Ponta Grossa).

Bacila obteve título de doutorado na USP (Universidade de São Paulo) ao interpretar as violações dos direitos humanos cometidas desde 1967, ano em que ocorreu a chamada “guerra dos Seis Dias”, culminando com a anexação do que restava da Palestina (Cisjordânia e Gaza) por parte dos israelenses e que dificultam até hoje as negociações para a criação do Estado Palestino. Bacila aponta um cenário de desproteção total da população palestina na região, privada do mínimo de direitos civis, com a sistematização da tortura, atividades de grupos de extermínio, agressões com armas de fogo contra civis, dentre outras situações de violência que expõem a vulnerabilidade da população civil palestina no dia a dia.

Com a presença da internet como meio alternativo de divulgação das questões palestinas, rompendo o isolamento da grande mídia ao assunto, Bacila afirma que o tema vem despertando interesse dos meios acadêmicos diante das atrocidades cometidas pelo Estado de Israel, alvo de denúncias em sites, blogues e redes sociais. O historiador destaca que essas informações começaram a gerar comoção e pressão na comunidade internacional para que os métodos de negociação e convivência com um povo oprimido, como o palestino vêm enfrentando de maneira intensificada há cerca de 70 anos.

“É natural que a gente tenha um saber que, sob a luz científica [surgida com o interesse nas universidades], vai ser um saber altamente crítico ao discurso hegemônico. Como em outros termos é o oprimido que vai produzir a ciência, porque ele não precisa ideologizar o discurso, no sentido de criar uma falsa consciência, a ciência vem num sentido de descoberta de realidade que vai favorecer as causas de libertação. Inclusive a ONU vai se prestar a esse papel a partir dos anos 60, de ser uma organização anticolonialista”, afirma Bacila, dando como exemplo a criação do próprio Dia Internacional de Solidariedade ao Povo Palestino, lembrado na quarta-feira (29/11).

Diáspora

A diáspora palestina no Brasil foi o tema do projeto de doutorado defendido na USP por Luciana Garcia de Oliveira, formada em Direito e mestre no Programa Interdisciplinar de Estudos Judaicos e Árabes do Departamento de Letras Orientais da USP.

Luciana afirma que seu trabalho constatou que a vinda de palestinos e o nascimento de descendentes diretos do povo no Brasil se confundem com a história recente do país. “Tivemos muitos palestinos que participaram ativamente da campanha pelas Diretas Já [Movimento popular na década de 1980 que defendeu a transição do governo militar para o civil por meio de eleição direta, que foi reprovado no Congresso, dominado pelos militares]”, destaca a pesquisadora. O trabalho apurou ainda a fundação da FEPAL (Federação Árabe Palestina do Brasil), entidade criada para mobilizar a colônia palestina no Brasil pelo direito à sua própria terra.

De acordo com Luciana, trabalhos em língua portuguesa que abordam a questão palestina são estratégicos para atrair o interesse de estudantes universitários a respeito do assunto. “Os jovens precisam compreender o tema, que tem repercussões em todo o mundo”, afirma a especialista.

Motivo de comemoração

“Setenta anos depois, exatamente hoje, numa data trágica que representa o início da tragédia palestina, quando a ONU resolve partilhar um território que não seria partilhado para dá-lo a estrangeiros, por incrível que pareça, temos sim o que comemorar”, afirma o diretor de Relações Institucionais da FEPAL, Ualid Rabah. O diretor observa que o aumento do interesse acadêmico pela causa palestina representa uma reviravolta na realidade universitária. “É nítido que a narrativa sionista, pró-Israel, que era predominante nos meios acadêmicos, especialmente nas pós-graduações, começou nos últimos anos a ser quebrada. Isso é motivo de muito orgulho para os palestinos e para aqueles que defendem a causa palestina.”

Os estudos aprofundados servem como referência para desmontar discursos antes predominantes e que não correspondem à realidade. “Não se trata de narrativa panfletária, de mera manifestação desses setores universitários, mas sim na forma de pós-graduações muito sólidas que desmistificam a totalidade dos acontecimentos na Palestina desde seus tempos mais antigos até os episódios mais recentes, que culminaram em apartheid, segregação racial, de supremacismo racial e do uso de legislação ‘extra-apartheid’, dissimulando legislações para promover o apartheid tal qual aquele da África do Sul. As dissertações de mestrado, as teses de doutorado e as demais pós-graduações e trabalhos de conclusão de curso estão lançando novas luzes no meio acadêmico sobre a questão palestina”, afirma Ualid.

 

Fonte: Porém.net

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